A propósito do Concurso Público
nº 2012/102 para Prestação de Serviços Médicos, todos os pontos contidos no
Anexo II (reconhecidamente uns mais que outros) merecem cuidada reflexão, numa
dupla ou tripla perspectiva.
Ao que parece, o M.S. unicamente
pretende abrir um concurso para a prestação específica de serviços de anestesia
no Bloco Operatório (BO) e Consulta, porque precisa de assegurar a anestesia
para operar doentes no BO, ponto.
No fundo, o M.S. não pretende
mais do que “centralizar” uma iniciativa desde há muito utilizada por diversos
hospitais: - contratar “tarefeiros”, especialistas de anestesiologia, para
assegurar alguns tempos operatórios especificamente no Bloco Operatório (e não
no Bloco de Partos ou “locais remotos”, por exemplo).
Penso que até vai um pouco mais
além do que esses hospitais, por incluir a vertente “consulta”. Ou seja, leva
em conta a necessidade de que exista uma avaliação pré anestésica e que esta
deve ser feita por Anestesiologia. Digamos que se trata de uma “evolução” no pensamento
de alguns “peritos”…
Verdadeiramente, não é legítimo
que as pessoas “reparem” no ponto 15 (excepção feita a alguns) se, até hoje,
nunca se pronunciaram de alguma forma sobre tal “solução” e, a ter que ser
encarada, em que condições técnicas (e outras) seria razoável aceitá-la,
pugnando assim por objectiva e pragmaticamente escolher o “mal menor”.
A verdade não tem ideologia… (onde é que eu já ouvi isto?...)
Assim, retirando as tais
excepções, penso que para a generalidade dos colegas o problema está centrado
no preço, que o M.S. quer que seja o
mais baixo possível - critério de adjudicação do concurso.
Com isto não pretendo dizer que
essa não seja uma preocupação legítima.
O que desejo é que se chamem as
coisas pelos nomes, que se faça uma reflexão sobre “todo” o problema e, naturalmente, que se passe a ser intransigentemente
coerente.
Numa perspectiva benevolente, poderá não estar em causa o âmbito das
competências da especialidade de Anestesiologia e, consequentemente, as
actividades que a mesma desenvolve no processo assistencial dum hospital,
correctamente organizado, eficiente e que garanta a efectividade de cuidados.
Mas, por pensar que o M.S. poderá
já estará melhor informado sobre o que acabo de referir, quero contribuir com
algumas “achegas” que daí resultam.
Assim, devo dizer que em minha
opinião faltam cláusulas na formulação do aviso de abertura do concurso que,
obrigatoriamente, deverão constar do contrato a formalizar com as entidades a
quem forem adjudicados as prestações de serviços.
E essas têm a ver, por um lado,
com a avaliação de desempenho dos colegas contratados (quantitativa e
qualitativamente) e por outro com a avaliação da eficiência e efectividade de
cuidados que desta forma passam a ser assegurados nos hospitais.
Matéria talvez delicada, tendo em
conta a interdependência e multidisciplinaridade que caracterizam o trabalho em
saúde.
Como é lógico, se não forem
alcançados os padrões convenientes (objectivos que é necessário definir), os
médicos contratados em prestação de serviços, devem ser de imediato
dispensados. E as empresas em que se integram, deverão ter penalidades.
Reparem
no ponto 1 do anexo (pág. 41): - “O
prestador de serviços deverá ter conhecimento directo dos protocolos de
medicamentos, protocolos clínicos e outros, bem como dos regulamentos da
Instituição, junto do Direcção da Instituição de Saúde, para seu efectivo
cumprimento”.
Estamos a falar de integração na
instituição e no Serviço específico. Quem deve zelar/ser responsável por essa
integração?
E,
já agora, o ponto 3 do mesmo anexo: - “… sendo coordenados com a restante actividade assistencial da
Instituição de Saúde e em consonância com a “legis artis” comum a qualquer acto médico, de acordo com os
preceitos éticos e deontológicos definidos pela Ordem dos Médicos…” .
Quem pode/deve coordenar o que é referido e
quem pode/deve estar permanentemente atendo à boas práticas no Serviço?
No
ponto 11: - “ A Instituição de Saúde
reserva‐se o direito de exigir provas práticas para as funções a serem
exercidas”.
Para
a prestação de serviços de Anestesiologia será alguém que não um especialista
de Anestesiologia a fazer tais provas?
Também o ponto 12: -
“Os profissionais médicos
devem manifestar notórias capacidades de organização”.
Quem avalia e como deverão
ser avaliados ?
E se eles (os concorrentes) não perceberem o que está implícito nos
pontos 1, 3 e 11, por exemplo, não têm obviamente as tais “notórias capacidades
de organização”… logo não servem…
É obviamente impensável que
aspectos como o desempenho dos profissionais (quantitativo e qualitativo), a
gestão de qualidade em geral e do risco clínico em particular, da eficiência e
efectividade da prestação de cuidados, passem em claro dentro de qualquer
hospital.
O aviso de
abertura deste concurso é “explicitamente” omisso nesta matéria, o que é grave. É
obviamente necessário que os contratos para formalizar tal prestação de
serviços considerem "explicitamente" estes aspectos.
Parece-me que alguns responsáveis
da gestão, em diversos níveis, vão evidenciando alguma dificuldade em destrinçar
entre o que é o “bem” e o que é o “mal”.
Tanto do ponto de vista organizativo,
como no que se refere à eficiência e efectividade dos cuidados, como até em
relação a aspectos legais e éticos.
Mas, meu Deus, os médicos do
quadro da instituição estão lá, no Serviço !
Entre eles, os respectivos
Directores!
Será que também, todos eles, não
têm esse discernimento e não serão capazes de actuar em conformidade?
É bem verdade que chegou a altura de se saber não só quanto, mas também o que valem os médicos.